quinta-feira, 23 de setembro de 2010

** Aconteceu no Reino Encantado em 22/09/2010

- Rainha Menina, já soube que a Rainha do Reino de Baixo largou tudo e foi embora?

- Sim criança. Felizmente ela está bem.

- Como sabe?

- Ela me escreveu contado sua experiência. Leia o que diz de si mesma:

“Chovia muito e o frio era intenso. As lágrimas dos céus misturavam-se com as lágrimas que meus olhos despejavam sobejamente.

No vai-e-vem incessante pessoas por mim passavam, com guarda-chuva e capas, muito apressadas, nem se dando conta daquele Ser que ali estava parada, estagnada pela desesperança e medo.

Revolvi sentar-me em um banco do jardim que margeava as praias. Pouco me importava com a chuva e muito menos com o frio. O banco me pareceu um porto seguro, pois ainda não havia resolvido o caminho que iria tomar.

Vinte e três anos de casamento e poucas horas de liberdade.

Havia saído assim, sem rumo nem prumo, libertando-me da prisão de emoções em que vivia há anos bastante para se considerar uma velha. A pergunta recorrente era: “Mas o que vai acontecer agora?”. O medo trazia a insegurança que gritava em minha mente: “Voltar para casa”.

Não. Esta não era a solução. Era apenas a mente que mente falando, e devia sim ouvir o Coração. E este dizia: “Você não voltará”. Apazigüei-me.

Agora que decidira ir embora tudo renascia. Eu renascia na Esperança de um viver pleno de Amor e Felicidade. Não havia, porém, somente alegria e alívio dentro de mim.

Também um pouco de medo e vinte anos.

De onde me encontrava visualizava o mar e fiquei um momento pensando se aquele trecho seria fundo, porque se tornava impossível adivinhar: as águas escuras, sombrias, tanto poderiam estar a centímetros da areia quanto esconder o infinito.

Resolvi de novo encontrar meu amigo de infância, agora que estava livre. Aquele ser encantado, que entendia minhas dores e as aplacava. Estaria ele no fundo do mar? Onde se encontrava? A simples lembrança mágica de seu amigo encantado trazia-me um sabor de liberdade há vinte anos não sentido.

Porque meu marido tinha o dom de apenas com sua presença tolher até mesmo meus pensamentos? O viver ao seu lado era de uma mesmice angustiante. Tinha a fama daquele que é bom e nunca erra. O bom senso ambulante que tolhia meu riso, permitindo-me apenas viver atrás da janela observando através das vidraças as estações do ano se sobreporem.

Desejos? Não era permitido, pois não eram de bom tom.

A chuva parou. Um guarda municipal me olhava insistentemente, talvez achando que eu fosse me jogar no mar, que fosse uma louca em busca do seu fim. Que devo fazer? Talvez me aproximar dele e dizer: “Seu guarda, não sou louca nem nada. Era uma mulher casada, agora sou apenas mulher!” Riu de seus pensamentos e pôs-se a caminhar, sentindo-se livre, leve e solta, deixando para trás também o policial.

Amanheceu. Terei a manhã livre para comprar o necessário para a viagem, porque o navio parte no inicio da tarde. Quando embarquei o mar está quieto, quase sem ondas. O céu de um azul violento, gritante. O navio se afasta rapidamente... As águas cantam no casco, com suavidade, cadência... Em torno, as gaivotas esvoaçam, brancas espumas fugidas do mar. Sim, tudo isso me levará ao encontro de meu amigo e companheiro que estará no Porto da Felicidade a me esperar!”

- Passou maus bocados, mas certamente chegará ao seu Porto Seguro.

- Sim, vai em busca do Amor Real. E certamente o encontrará.

Walkyria Garcia

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